MAIS UM DIA

Hoje morreu um homem nos trilhos do trem, ainda moço, pouco dinheiro no bolso, cansado de roer osso, bateu no fundo do poço, partiu pra estação do além, era tão moço, olhei no seu rosto, tranparecia desgosto, também pudera, depois vim a saber, ele não quis abrir mão da TV que era dela, nem do terreno, nem das janelas, enquanto Maria levava o telhado, a porta e suas filhas, filhas essas que não pôde mais ver, sujeito forte, trabalhava de escort, custava adoecer, quase nunca aparecia, mas quando acontecia era bonito de se ver, família reunida, apareciam tios e tias, todavia, Maria fôra traída e essa ferida não conseguia esquecer, e sem saber da tragédia decidiu se vingar, olhou para os lados, lembrando do ingrato, temperos, pratos e facas se misturavam no armário, e ela viu a solução, veneno de rato, pegou um punhado, embebida de vingança e amor, amassou com um garfo, picou com a faca, fez farelo no triturador, com tomilho, coentro, curry e hortelã, fazia a mistura pensando no dia de amanhã, com o sorriso largo, tragou seu cigarro, recheou o pato e na boca do leitão colocou a maçã, olhava orgulhosa o que acabara de fazer, e agora como faria pra ele comer? e se todos comessem menos ele, seria o único a sobreviver... Maria ficou confusa, comeu um cacho de uvas, a comida lhe fazia relaxar, um belisco após o outro e sem perceber comeu o recheio e a lembrança logo veio, esqueceu de colocar hortelã, olhou pela janela era uma linda manhã, cansada e sem saber que João tinha partido logo cedo sem adeus dizer, deu mais uma colherada e decidiu morrer.
Rollmopis
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